Por Vitória Pereira
Um dia me perguntaram sobre os sentidos da vida. Não me lembro se foi no psicólogo, no psiquiatra ou em uma conversa na mesa de um bar às 03 horas da manhã, enquanto tocava um cover incrível de Legião Urbana. Eu me peguei pensando naquela tarde de domingo: quais eram os sentidos da vida naquela semana- que, por sinal, não faziam sentido nenhum no momento- Mas e se a vida for isso mesmo? Seguir os sentidos que nos proporcionam pequenos momentos de prazer e entendimento sobre ela.
Em uma conversa com inúmeros jogadores que jogam no time da vida, chegamos a uma conclusão: o sentido da vida é ir. É seguir em frente. É linha reta. Ou pelo menos, esperamos que seja. É triste perceber que o sentido da vida não é nada disso. Não há linha reta, direção, manual ou regras; o cotidiano nos abraça lentamente, e quando nos damos conta, a vida não faz sentido, ou só passa a ter sentido com as milhares de informações do dia a dia- que, por sinal, é adoecedor. Em uma conversa paralela, em um sofá retrátil e com alguns cinzeiros espalhados como se fossem decoração, Manoel me disse que o sentido da vida é viver uma vida plena, conquistar lugares, viajar, trabalhar e ganhar bem. Mas, infelizmente, ele se encontra perdido na espiral do trabalho
Vamos lá, talvez você também ache que o sentido da vida é viajar. Afinal, quem não quer conhecer a Grécia? Fazer um mochilão pelo Brasil e, de quebra, ter um golden ao seu lado como seu melhor amigo? Mas, no Brasil, sabemos que é impossível viver com um salário mínimo. É impossível alcançar o bem-estar quando pessoas dormem embaixo de viadutos, em bandeiras de esplanadas ou em arquiteturas hostis. Qual o sentido da vida para essas pessoas?
Eu ouvi exatamente essa frase em um vídeo do TikTok: “A vida? A vida é uma maravilha!”. E de fato ela é mesmo, mas para algumas pessoas, esse bordão funciona muito bem quando se tem acesso a lugares que são exclusivos a uma certa categoria. Chegamos a um ponto chave: você se lembra do Manoel?
Pois bem, ele me disse que o sentido da vida às vezes deixa de fazer tanto sentido, porque olhar para frente cansa, dói e nos choca. Olhar para frente te dá uma percepção dura: a realidade.
A felicidade é transformada em um produto a ser adquirido, e o consumismo se torna um estilo de vida. Mas eu não julgo quem é um grande consumista- ora, eu também sou- e eu sei que essa lógica vem de um espaço muito íntimo: quando se vem do nada, o tudo é uma maravilha. É isso, a máquina de desejo guia nossos sentidos, e a todo momento um combustível a abastece. Seja bem-vindo, capitalismo.
A Fernanda é uma das pessoas mais gentis e engraçadas que conheci. Ela disse que o sentido da vida tem a ver com afazeres que nos dão prazer, honrar quem veio antes de nós e fazer com que a vida seja mais leve para os que vierem depois. Está vendo como é diferente? Os sentidos são muitos, e claro, todos aceitáveis. Mas Fernanda é uma mulher preta de 24 anos, vem de origem humilde, e hoje está se formando em psicologia. O sentido da vida para ela nem passou pela lógica do capitalismo; vem de um ambiente onde a dor e o amor estão próximos, de mãos dadas, esperando o próximo baque para, como eu disse, seguir em frente.
Eu faço parte de um time que também joga no time da vida. Mas esse time se encontra em outra categoria: somos o sub-20 e nosso campeonato é a “crise dos 20 e poucos anos”. Nós, meros jovens jogadores, estamos basicamente meio desesperados com a vida, meio confiantes de que tudo vai dar certo, meio surtados e meio em paz. E esse talvez, por tempo indeterminado, seja o sentido de nossas vidas, até chegar na crise dos 30. Será que o sentido da vida é superar crises? Aprender a encontrar bons momentos nela e viver com o caos? Sinceramente, eu não sei. Mas isso me traz mais sentido ainda.
Mas calma, eu jamais vou lhe dizer para não olhar para frente, nem para não seguir o caminho, até porque a minha religião diz que os caminhos são as verdades, as conquistas e as oportunidades; os caminhos, acima de tudo, são possibilidades. Mas de onde eu venho, é necessário olhar para trás, para a linha de fundo, para o princípio, para a raiz, para o passado. O sentido da vida está aí: para mim, é seguir,
mas jamais esquecer de onde venho e aonde mereço chegar. E isso só pode acontecer quando eu jamais, em hipótese alguma, esquecer-me, nem por um minuto, de não me perder de mim. E isso pode ser difícil, tá?! O capitalismo nos vende a ilusão de que a felicidade e o sentido se encontram nas coisas, mas a verdade é que o sentido não vai chegar nunca enquanto você não o encontrar dentro de si mesmo. E que fique claro, isso não é papo de coach.
Mas me diz, isso tudo fez sentido pra você? Se sim ou se não, fico grata por chegar até aqui.
Cultura Preta 
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