O grande sucesso do novo trabalho de Coruja BC1 o álbum ”Versão Brasileira Vol. 1” é eminente, o rapper paulista alcançou mais de 1 milhão de streamings nas plataformas digitais, o álbum com 9 faixas e participações de nomes como MC Luanna, Neguinho do Kaxeta, Akira Presidente e vários outros grandes nomes da música nacional. E nada melhor que falar com o criador dessa obra sobre a construção do álbum e também falar um pouco da sua carreira e trajetória.

Coruja BC1 Foto: Gabriel Florêncio

CP: Primeiramente fale um pouco sobre a capa do EP

Pô, primeiramente, boa tarde. Satisfação estar trocando ideia com vocês. Pra falar do EP. É muito gratificante poder falar do nosso trabalho. Ter esse espaço, essa abertura nos veículos pra poder falar um pouco mais sobre a nossa arte. O tênis é, na verdade, a ideia da capa. Eu fiquei pensando por muito tempo, eu e a Isis, que é minha manager e tal, a gente pensando muito assim em como a gente imprime uma estética que a gente encontrasse uma sofisticação no sujo, né? E que fosse uma sofisticação assim, quando eu falo sofisticação, algo que fosse bonito esteticamente, mas também que fosse algo muito São Paulo, sabe? Algo que representasse São Paulo e representasse tipo o que a gente queria transmitir nas músicas.

E aí eu comecei a pensar sobre o que representa o tênis no fio, né? O tênis no fio é tipo uma maneira de você unir uma estética suja, que é muito São Paulo, rua mesmo e ao mesmo tempo também você colocar uma coisa que representa a moda, e o tênis no fio nas periferias de São Paulo é muito mais além do que um tênis no fio. A gente, pelo menos quando era pivete nas quebrada, o tênis no fio era uma demarcação da onde vendia droga, perto da onde tinha uma biqueira e tal. E aí, pensando nisso, eu pensei que por muito tempo a nossa música também foi tida como uma droga, como algo proibido, como algo marginalizado, principalmente pelas grandes mídias. Principalmente por uma elite. Então eu queria dar esse significado também de tipo assim, o que vocês estão prestes a ouvir é algo que pra muita gente é proibido, mas é algo que sobreviveu. Que passou as gerações, e por isso que a gente escolheu também uma tipografia do Pixo, que é uma representação de São Paulo e é algo também marginalizado pra caramba, pra falar o que a gente tem pra transmitir nesse disco, música de periferia mesmo, música periférica, osasquense original de São Paulo, tá ligado?

CP: Na sua infância o que te influenciava musicalmente?

Nas quebradas nos extremos de Osasco, é muito forró. Sabe, forró, samba pra caramba também. Ali, tipo, do lado que eu morava no Munhoz Junior, era do lado do Helena Maria, que tem o Império Lembro de Helena Maria, que é uma escola de samba também, de Osasco. Funky no final dos anos 90, início dos anos 2000, o Axé. Mas eu acho que o forró foi algo muito predominante ali nas periferias, porque ali onde eu morava, no Munhoz Júnior, é uma área de imigrantes nordestinos, predominantemente de várias regiões do nordeste brasileiro. Inclusive a minha família, dos dois lados, é de nordestinos.

CP: O álbum trás algumas faixas com características do funk, como e sua relação com esse ritmo e se tem algum artista do gênero que você acompanha com frequência?

Eu escutei vários, Renatinho Alemão, Cidinho e Doka, Claudinho e Buchecha, teve vários funqueiros que me influenciaram mesmo, o próprio finado Catra, vários fanqueiros. Porque o funk era muito presente ali. Osasco e um berço são muito ricos de funk, é um lugar que respira muito funk, até mais do que rap, preciso dizer isso, que é um lugar que é muito do funk. Eu acho que também tem uma parada no funk que eu gosto muito, que tem tudo a ver, hoje eu sou iniciado na religião de matriz africana mesmo, na religião tradicional Yorubá, mas eu vim do candomblé, né cara, então os tamborzão do funk tem tudo a ver com a espiritualidade com que eu cresci ouvindo e me faz sentir melhor, tá ligado? Que me faz sentir mais vivo no mundo.

CP: E como surgiu a parceria com Neguinho do Kaxeta?

O Neguinho do Kaxeta é um parceiro, cara. O amigo, eu conheci o Neguinho do Kaxeta, que a gente tem uma música que a gente começou a fazer até hoje, não acabou, que era uma música do Boykilla. Era eu, o Boikilla, o Neguinho do Kaxeta e o Mano Brown.

Nós nunca acabou, porque nós foi para o estúdio, aí eu e o Brown começamos a conversar, conversar, e nós não escrevemos, e a música ficou parada. E aí foi quando eu conheci o Neguinho do Kaxeta, eu já era fã pra caramba dele, da obra dele. Acho que o Neguinho do Cacheta é um cara que não é como ninguém no funk, as periferias não só de São Paulo, mas as quebradas da baixada, tá ligado? E aí tipo, mano, a gente tinha feito uma outra parceria, o Neguinho chegou aí em casa quando eu tinha um estúdio, antes do casar eu tinha um estúdio, ele chegou a colar lá, quem levou ele foi um parceiro meu também que é do funk, o Nego Blue. E aí a gente colou junto, a gente fez um som que saiu pela Love Funk e tal, que é o Hit Manos e tudo mais. E aí a gente tava um tempo já pra fazer um som só nós dois assim, sabe? E aí quando eu vi o ‘Versão Brasileira’ assim, quando eu comecei a ver e desenhar ele, eu falei cara, tem uma música aqui, essa música aqui é a cara do Neguinho do Kaxeta. Eu já tinha uns versos. E aí ele trouxe a melodia da Corpo Fechado, né? Que é mais um Neguinho do Kaxeta feat Coruja do que Coruja feat Neguinho do Kaxeta, porque ele já tinha aquelas duas partes. Eu tinha mais uma melodia e a gente fez o ‘Corpo Fechado’. Foi uma parada muito de sintonia mesmo, tinha que ser aquela música daquele jeito, daquele momento. E é foda, porque o Neguinho do Kaxeta é um cara que é uma influência não só no funk, mas para vários de nós do rap, ele é um cara que influenciou muito a gente a rimar, ele tem um jeito de falar de São Paulo com uma particularidade que é muito de São Paulo. E eu acho que era totalmente o que eu estava buscando por essência desse disco.

CP: O EP tem a participação de grandes artistas como MC Luanna. É uma forma de você valorizar os artistas daqui, da nossa quebrada?

Sim, eu tenho pra mim, quando comecei a fazer esse disco, que era tipo assim, eu fui curador em um projeto X e tal. E é muito louco eu ser curador porque eu já fiz vários editais e eu nunca tive um edital aprovado, tá ligado? Mesmo eu precisando de grana pra caramba em vários momentos da minha vida eu nunca tive um edital aprovado. E isso é uma mágoa que eu tenho, particular mesmo. Então quando eu fui curador eu tento fazer com que projetos que não são ouvidos dos extremos sejam ouvidos, sabe? Sejam lidos, sejam escutados e que eles sejam aprovados de alguma forma. Porque eu sei como funciona. E aí um parceiro de outro estado, que deu uma confusão, ele falou: ”não, porque os bagulhos de São Paulo não pode ser aprovado aqui, São Paulo tem tudo”. Eu falei, como assim tem tudo? Estou há mais de 20 anos na cultura, estou há mais de 13 no rap, eu nunca tive edital aprovado, eu escrevi vários.

E aí eu entendi uma parada, cara, que tipo assim, a galera de fora olha para São Paulo, principalmente uma galera também que vem do mesmo lugar que a gente veio, vem para São Paulo fazer a vida e tal, tipo na música e tudo mais, e acha que São Paulo é os lugares onde essa galera está circulando, tipo a Vila Madalena, o Alto de Pinheiros, a Avenida Paulista, quando na verdade invisibiliza mais, e não essa galera invisibiliza, mas os lugares os extremos continuam invisíveis e aí eu vi o quanto quanto é invisível é os extremos da nossa cidade tá ligado e tipo eu falei não cara eu preciso fazer um disco São Paulo para periferia de São Paulo para os extremos de São Paulo tá ligado um disco que dá cor para essa cidade invisível que a galera faz questão de deixar mais invisível ainda entendeu, e bater no peito e porque eu sou um pouco barista bater no peito falar assim porra eu sou de São Paulo sou de Osasco mano vai segurando.

Eu acho que também São Paulo ficou um pouco acuado porque teve uma geração do rap de São Paulo que era feito por uma classe média. Principalmente ali em meados de 2015, 2016. E aí eu vejo que a galera começou a achar que só tinha playboy aqui, tá ligado? Quando na verdade a maioria é de batalhadora, de sofredor igual nós. Então eu sentia a necessidade de bater no peito e falar: ”Mano, eu sou um cara de Osasco, da periferia de Osasco”. E não buscar um rap que fosse uma continuação só dos meus alvos, mas que fosse uma continuação de todos os discos que eu escutei lá atrás, por exemplo, do ‘Nada Como Dia Após Outro Dia’, do ‘Sobrevivendo no Inferno’. Que fosse um disco que desse continuidade no meu tempo às coisas que eu cresci e aos artistas também que narravam, eram os cronistas originais dessa cidade, eu me vejo como uma continuação deles.

CP: Coruja, em mais de 10 anos de carreira voce tem 7 álbuns produzidos, houve alguma mudança da produção para o primeiro álbum até o lançamento de ”Versão Brasileira, Vol. 1”?

É interessante essa pergunta, porque quando eu paro para pensar nas minhas primeiras mixtapes, principalmente antes dos meus primeiros álbuns, eu penso no seguinte, que a principal diferença hoje é o recurso, o recurso faz toda a diferença. Não só a bagagem de 10 anos vivendo de música, mas também sobre os recursos, tipo isso faz toda a diferença no processo, para a velocidade que você vai fazer o processo. O resultado final do processo, assim, é muito complicado você fazer um disco com dinheiro muito contadinho, sabe? Tipo assim, você não vai conseguir atribuir uma qualidade que ele merece com menos recursos, entendeu? É diferente, por exemplo, de um país, de um Estados Unidos da vida, cara, onde tipo um Macbook não é 20 mil reais, tá ligado? Tipo assim, não é superfaturado de imposto, do dólar. Então, dentro da realidade de um cara de periferia americana ele consegue ter os equipamentos, ele consegue comprar um computador que é necessário, ele consegue comprar um material para fazer um home studio, sabe, e fazer trabalho super ok. Aqui não, aqui é tudo tão distante, é tudo tão caro. E eu acho que esses recursos, falando da parte financeira mesmo, eu não tenho muito tato para falar sobre isso, eu falo abertamente mesmo. Eu acho que o que faz diferença é o investimento, a parte financeira, os recursos.

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Eu acho que isso faz com que eu faça não com mais tranquilidade, mas faça com a qualidade que isso merece. Porque desafios a gente sempre tem, por exemplo, o desafio era ter recursos que fizessem isso lá atrás. Hoje o desafio não é ter os recursos que faz, é ter recursos para o pós e para sair numa largada, numa competição do mercado, da maneira mais igualitária possível, mesmo estando muito atrasada.

Por exemplo, hoje, o grande desafio da indústria para qualquer para qualquer um é saber que tipo existe uma parada chamada algoritmo então o mercado não transforma não não funciona da mesma forma que funcionava por exemplo em 2017 até começo de 2018 muita coisa acontecia no orgânico hoje nada acontece no orgânico praticamente tudo aí é colocado uma bala, tipo as distribuidoras colocam o dinheiro na parada e muitas vezes você não tem o mesmo recurso que outros artistas de grandes managers para colocar a mesma bala na parada então isso faz você sair muito atrás então hoje é o outro desafio tá ligado.

CP: Como se sentiu após o álbum bater 1 milhão de streamings em menos de 1 semana, como você recebeu esse acontecimento?

Mano, eu fiquei muito feliz porque é como você falou mesmo, tipo, não é toda artista que tem esse feito, e também ao mesmo tempo é ao mesmo tempo eu sou um cara que sempre que eu realizo o sonho eu já tô sonhando de novo, eu sou uma pessoa muito sonhadora. Tipo, quero ir muito pra cima, quero fazer as apresentações agora, os shows, eu preciso trazer para as pessoas, essa experiência, eu adoro vivo, as pessoas precisam entender que ali (álbum) é só um currículo, o emprego mesmo, o efetivado mesmo vai ser quando a gente se trombar nos shows, trocar energia. Eu sou uma pessoa muito movida a shows, a calor humano, a essa troca sincera e eu preciso disso para caramba, então agora o próximo passo é fazer essa turnê e levar. Dia 15 agora a gente vai estar na Brasilândia, dia 26 a gente vai estar em Jundiaí de agosto, né? Dia 30 a gente vai estar em Guajanás, na Arena do Flow dia 8 a gente vai estar de setembro, a gente vai estar em Recife, já tem um monte de data acontecendo estamos também fechando Salvador, Rio então vai ter uma turnê bem legal aí pra gente curtir juntos.

Coruja ainda deixou um recado sobre o disco: ”E pode esperar mais lançamentos relacionados ao disco, a gente está preparando material bem legal aí inédito para para soltar junto então vai acontecer muita coisa aí nos próximos meses até o final do ano vai acontecer muita coisa legal aí relacionado a ”Versão Brasileira”.


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